Resumo Executivo 63219 Divulgação proibida até 19 de novembro de 2012, 00h01 GMT Diminuir calor o por que um mundo 4 °C mais quente precisa ser evitado Resumo Executivo Diminuir calor o por que um mundo 4 °C mais quente precisa ser evitado Novembro de 2012 Um relatório do Potsdam Institute for Climate Impact Research e da Climate Analytics para o Banco Mundial © 2012 Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento / Banco Mundial 1818 H Street NW Washington DC 20433 Telefone: (+1 202) 473-1000 Internet: www.worldbank.org Esta obra foi produzida pelo quadro de pessoal do Banco Mundial com contribuições externas. As constatações, interpretações e conclusões apresentadas neste documento não refletem necessariamente as opiniões do Banco Mundial, da Diretoria Executiva nem dos governos por ela representados. O Banco Mundial não garante a exatidão dos dados incluídos nesta obra. Os limites, cores, denominações e demais informações mostrados nos mapas nesta obra não implicam, por parte do Banco Mundial, qualquer tipo de juízo sobre a situação jurídica de um território nem o endosso ou aceitação desses limites. Direitos e Permissões O conteúdo desta obra está protegido por direitos autorais. Como o Banco Mundial incentiva a disseminação do seu conhecimento, esta obra poderá ser reproduzida, no todo ou em parte, para fins não comerciais, desde que se inclua a referência completa à obra. As demais consultas sobre direitos e licenças, inclusive sobre direitos subsidiários, devem ser remetidas para Office of the Publisher, World Bank, 1818 H Street NW, Washington, DC 20433; USA, fax 202-522-2422; e-mail pubrights@worldbank.org. B Agradecimentos O relatório Diminuir o calor: por que um mundo 4 °C mais quente precisa ser evitado é o resultado das contribuições de uma ampla gama de especialistas de todo o mundo. Agradecemos a todos que contribuíram para a riqueza e a perspectiva multidisciplinar desta obra. A redação ficou a cargo de uma equipe do Potsdam Institute for Climate Impact Research and Climate Analytics formada por Hans Joachim Schellnhuber, William Hare, Olivia Serdeczny, Sophie Adams, Dim Coumou, Katja Frieler, Maria Martin, Ilona M. Otto, Mahé Perrette, Alexander Robinson, Marcia Rocha, Michiel Schaeffer, Jacob Schewe, Xiaoxi Wang e Lila Warszawski. O relatório foi encomendado pela Equipe Mundial de Especialistas em Adaptação à Mudança Climática do Banco Mundial, liderada por Erick C.M. Fernandes e Kanta Kumari Rigaud, que trabalharam em estreita colaboração com o Potsdam Institute for Climate Impact Research and Climate Analytics. Jane Olga Ebinger coordenou a equipe do Banco Mundial, que se beneficiou das valiosas informações oferecidas ao longo de todo o trabalho por Rosina Bierbaum (Universidade de Michigan) e Michael MacCracken (Climate Institute, Washington, DC). O relatório foi enriquecido pelos criteriosos comentários dos cientistas encarregados da revisão por pares. Gostaríamos de agradecer a Ulisses Confalonieri, Andrew D. Friend, Dieter Gerten, Saleemul Huq, Pavel Kabat, Thomas Karl, Akio Kitoh, Reto Knutti, Anthony J. McMichael, Jonathan T. Overpeck, Martin Parry, Barrie Pittock e John Stone. O trabalho também contou com a valiosa orientação e supervisão de Rachel Kyte, Mary Barton-Dock, Fionna Douglas e Marianne Fay. Somos gratos aos seguintes colegas do Banco Mundial pela sua contribuição: Sameer Akbar, Keiko Ashida, Ferid Belhaj, Rachid Benmessaoud, Bonizella Biagini, Anthony Bigio, Ademola Braimoh, Haleh Bridi, Penelope Brook, Ana Bucher, Julia Bucknall, Jacob Burke, Raffaello Cervigni, Laurence Clarke, Francoise Clottes, Annette Dixon, Philippe Dongier, Milen Dyoulgerov, Luis Garcia, Habiba Gitay, Susan Goldmark, Ellen Goldstein, Gloria Grandolini, Stephane Hallegatte, Valerie Hickey, Daniel Hoornweg, Stefan Koeberle, Motoo Konishi, Victoria Kwakwa, Marcus Lee, Marie Francoise Marie-Nelly, Meleesa McNaughton, Robin Mearns, Nancy Chaarani Meza, Alan Miller, Klaus Rohland, Onno Ruhl, Michal Rutkowski, Klas Sander, Hartwig Schafer, Patrick Verkooijen Dorte Verner, Deborah Wetzel, Ulrich Zachau e Johannes Zutt. Gostaríamos de agradecer também a Robert Bisset e Sonu Jain por seu trabalho de contato com parceiros, com a comunidade científica e com a mídia. Nosso muito obrigado também a Perpetual Boateng, Tobias Baedeker e Patricia Braxton pelo valioso apoio à equipe. Manifestamos nossa gratidão à Connect4Climate, que contribuiu para a produção deste relatório. iii iv Prefácio Meu desejo é que este relatório cause um choque e nos faça agir — mesmo aqueles entre nós já comprometidos com a luta contra a mudança climática. Espero que ele nos faça trabalhar com um senso de urgência ainda maior. Este relatório enuncia como o mundo seria caso houvesse um aquecimento de 4 graus Celsius, que é a previsão quase unânime dos cientistas para o fim deste século, se não houver mudanças sérias nas políticas. Os cenários de um mundo 4 °C mais quente são devastadores: a inundação de cidades costeiras; o aumento dos riscos para a produção de alimentos, com a possibilidade da elevação dos índices de desnutrição; muitas regiões áridas se tornando ainda mais áridas, regiões úmidas se tornando ainda mais úmidas; ondas de calor sem precedentes em muitas regiões, sobretudo nos trópicos; um agravamento substancial da falta de água em muitas regiões; o aumento da frequência de ciclones tropicais de grande intensidade e a perda irreversível da biodiversidade, inclusive das barreiras de corais. E o mais importante é que, por ser tão diferente do mundo atual, um mundo 4 °C mais quente nos apresenta uma grande incerteza e novos riscos que ameaçam a nossa capacidade de nos prepararmos e planejarmos para as futuras necessidades de adaptação. Com a falta de ação com respeito à mudança climática, corremos o risco de deixar a prosperidade longe do alcance de milhões de pessoas nos países em desenvolvimento e de reverter décadas de desenvolvimento sustentável. Já sabemos claramente muito sobre a ameaça que temos diante de nós. Não resta dúvida para a ciência de que o homem é a causa do aquecimento global, e profundas mudanças já estão sendo observadas: a mediana do aquecimento global está 0,8 °C acima dos níveis pré-industriais; os oceanos tiveram um aumento de temperatura de 0,09 °C desde a década de 1950 e vêm passando por um processo de acidificação; o nível dos mares elevou-se cerca de 20 cm desde o período pré-industrial e agora está subindo 3,2 cm por década; um número excepcional de ondas de calor extremo ocorreu nos últimos dez anos e grandes áreas de cultivo de alimentos são cada vez mais afetadas por secas. A despeito das melhores intenções da comunidade mundial de manter o aquecimento global abaixo de um aumento de 2 °C em relação às temperaturas do período anterior à industrialização, a elevação dos níveis de aquecimento é cada vez mais provável. Os cientistas concordam que as atuais promessas e compromissos dos países na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) muito provavelmente resultariam em um aquecimento da ordem de 3,5 °C a 4 °C. E quanto mais tempo se levar para cumprir essas promessas, maior a probabilidade de um aquecimento mundial de 4 °C. Os dados e indícios impulsionam o trabalho do Grupo do Banco Mundial. Os relatórios científicos, inclusive os produzidos pelo Grupo Intergovernamental de Peritos sobre Mudança Climática, embasaram a nossa decisão de intensificar o trabalho nessas questões. Destacamos a publicação de um relatório da v série World Development Report sobre a mudança climática destinado a aprofundar o nosso entendimento das consequências de um planeta em processo de aquecimento; um Quadro Estratégico sobre o Desenvolvimento e a Mudança Climática e um relatório sobre o Crescimento Ecológico Inclusivo. O Banco Mundial é um dos principais defensores de ações ambiciosas para fazer face à mudança climática não apenas pelo imperativo moral, mas também porque isso faz sentido do ponto de vista econômico. Mas e se não conseguirmos aumentar os esforços para atenuar essa mudança? Quais são as implicações de um mundo 4 °C mais quente? Encomendamos este relatório ao Potsdam Institute for Climate Impact Research e à Climate Analytics para ajudar-nos a compreender a situação atual da ciência e o possível impacto sobre o desenvolvimento nesse novo mundo. As diferenças entre ele e o mundo de hoje seriam tão drásticas que é até difícil descrevê-lo de forma precisa, pois muito depende de projeções e interpretações complexas. Estamos bastante cientes da incerteza em torno desses cenários e sabemos que os pesquisadores e seus estudos às vezes discordam quando se trata do nível de risco. Mas o fato de que esses cenários não podem ser descartados é suficiente para justificar o fortalecimento das atuais políticas para a mudança climática. Encontrar maneiras de evitar esses cenários é vital para a saúde e o bem-estar das comunidades em todo o mundo. Todas as regiões do mundo serão afetadas, mas os pobres e os mais vulneráveis serão os mais duramente atingidos. Um mundo 4 °C mais quente pode e precisa ser evitado. O Grupo do Banco Mundial continuará a defender energicamente os acordos internacionais e regionais, bem como o aumento do financiamento para fazer face à mudança climática. Redobraremos os nossos esforços para respaldar as iniciativas nacionais que têm crescido rapidamente para mitigar as emissões de carbono e construir a capacidade de adaptação, assim como para apoiar o crescimento ecológico inclusivo e o desenvolvimento consciente, que leva em consideração a mudança climática. O nosso trabalho no campo do crescimento ecológico inclusivo tem mostrado que, com o aumento da eficiência e o uso inteligente da energia e dos recursos naturais, surgem muitas oportunidades de reduzir drasticamente o impacto do desenvolvimento sobre a mudança climática, sem prejudicar nem a redução da pobreza nem o crescimento econômico. Este relatório faz uma clara advertência: a mudança climática afeta tudo. As soluções não estão apenas no financiamento climático ou em projetos nessa área. As soluções estão na gestão eficaz dos riscos e no cuidado para que o nosso trabalho — o nosso pensamento — esteja sempre voltado para a ameaça de um mundo 4 °C mais quente. O Grupo do Banco Mundial não se furtará a enfrentar esse desafio. Dr. Jim Yong Kim Presidente, Grupo Banco Mundial vi vii Resumo Executivo Resumo Executivo Este relatório apresenta um retrato da literatura científica recente e novas análises dos prováveis impactos e riscos associados a um aquecimento da ordem de 4 °C neste século. Trata-se de uma tentativa rigorosa de delinear uma série de riscos, debruçando-se sobre os países em desenvolvimento e, sobretudo, os pobres. Um mundo 4 °C mais quente enfrentaria ondas de calor, secas rigorosas e grandes inundações em muitas regiões, com graves impactos sobre os ecossistemas e os serviços a eles associados. Mas, se agirmos, esse mundo pode ser evitado e poderemos até manter o aquecimento abaixo de 2 °C. Se não houver novos compromissos e ações para reduzir as 2013–14, no seu Quinto Relatório de Avaliação. Ele se concentra emissões de gases do efeito estufa, o mundo provavelmente nos países em desenvolvimento, porém sem deixar de reconhecer sofrerá um aquecimento de mais de 3 °C acima das temperaturas que os países desenvolvidos também estão vulneráveis e correm do período pré-industrial. Mesmo que os atuais compromissos e um sério risco de enfrentar grandes danos causados pela mudança promessas de mitigação sejam levados a cabo, a probabilidade de climática. A série de eventos extremos no mundo todo continua que tenhamos um aumento acima dos 4 °C até 2100 gira em torno a pôr em evidência a vulnerabilidade não apenas dos países em de 20%. Se não forem levados a cabo, o aquecimento de 4 °C desenvolvimento, mas também dos países ricos e industrializados. poderá ocorrer já na década de 2060. Tal nível de aquecimento e A projeção do alcance da mudança climática e dos seus a consequente elevação do nível dos mares em 0,5 a 1 metro, ou impactos ainda está cercada de incertezas. Adotamos uma em até mais, até 2100, não seria o ponto final: um aquecimento abordagem baseada no risco, na qual se define o risco como ainda maior, atingindo níveis superiores a 6 °C, com elevações o impacto multiplicado pela probabilidade: um evento pode ter do nível dos mares de vários metros, provavelmente ocorreria uma baixa probabilidade, mas, ainda assim, constituir um risco nos séculos seguintes. elevado caso implique consequências graves. Assim, embora a comunidade global tenha assumido Nenhum país estará imune aos impactos da mudança o compromisso de manter o aquecimento abaixo de 2 °C climática. Contudo, é provável que a distribuição dos impactos para evitar uma mudança climática “perigosa�, e embora os seja intrinsecamente desigual e voltada contra as regiões mais pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países pobres do mundo, que têm menos capacidade econômica, menos desenvolvidos tenham indicado que um aquecimento institucional, científica e técnica para fazer face aos impactos e global acima de 1,5 °C constituiria uma grave ameaça ao seu adaptar-se a eles. Por exemplo: próprio desenvolvimento e, em alguns casos, à sua sobrevivência, • O aquecimento absoluto será maior nas latitudes mais o conjunto das políticas atuais — tanto as já implementadas, altas, porém o aquecimento que ocorrerá nos trópicos é como as prometidas — muito provavelmente resultará em um maior quando comparado à faixa histórica de temperatura aquecimento bem superior a esses níveis. De fato, de acordo e extremos a que os ecossistemas humanos e naturais com a evolução atual das emissões, é plausível afirmar que o estão adaptados e que conseguem suportar. O surgimento mundo segue uma trajetória rumo a um aquecimento de 4 °C de temperaturas extremamente elevadas e sem precedentes ainda neste século. nos trópicos, segundo as projeções, resultará em impactos Este relatório não é uma análise científica abrangente, como consideravelmente maiores sobre a agricultura e os ficará demonstrado pela análise do Grupo Intergovernamental ecossistemas. de Peritos sobre Mudança Climática (IPCC) a ser publicada em 1 Dimin ui r o ca lo r: p or qu e u m m u n d o 4 °C ma is qu en te pr ec isa ser evita do Figura 1: Estimativas da mediana (linhas) das projeções probabilísticas da temperatura para dois cenários de emissão sem mitigação (SRES A1FI e um cenário de referência próximo ao SRESA1B), sendo que ambos se aproximam do aquecimento de 4 °C até 2100 ou superam esse aquecimento por uma margem substancial. Os resultados desses cenários de emissão são comparados com cenários em que as promessas atuais são cumpridas e com cenários de mitigação em que o aquecimento é mantido abaixo de 2 °C, com uma chance de 50% ou mais. Um cenário hipotético também é apresentado, no qual as emissões globais cessam em 2016, como uma ilustração para comparar com as trajetórias viáveis dos pontos de vista técnico e econômico. A forte elevação do aquecimento após as emissões serem reduzidas a zero se deve à eliminação do efeito de sombreamento dos aerossóis de sulfato. A faixa de incerteza de 95% (área sombreada) é apresentada em um cenário apenas para facilitar a leitura do gráfico. Os cenários e métodos de modelagem podem ser consultados em Rogelj et al., 2010; Hare et al., 2011; Schaeffer et al., 2012. 5 Aumento médio da temperatura da superfície IPCC SRES A1FI, grande global acima dos níveis pré-industriais (°C) probabilidade de superar 4 °C Referência (próximo ao SRES A1B), 4 probabilidade de superar 3 °C Promessas atuais, quase certeza de superar 2 °C; Efeito das 50% de chance de superar 3 °C promessas 3 Estabilização em 50% de chance de superar 2 °C atuais RCP3PD, probabilidade de ficar abaixo de 2 °C; chance média de superar 1,5 °C 2°C 1,5°C Interrupção abrupta das emissões 1 mundiais em 2016, probabilidade de ficar abaixo de 1,5 °C Inércia geofísica 0 Cenário ilustrativo de baixa emissão com emissões negativas de CO2 a partir da metade superior da faixa Observações históricas da literatura na segunda metade do séc. XXI 1900 1950 2000 2050 2100 • A elevação do nível dos mares nos trópicos provavelmente escolhas — ou, infelizmente, da falta de ação — dos governos, será 15% a 20% superior à mediana mundial. do setor privado e da sociedade civil. • O aumento da intensidade dos ciclones tropicais deverá ser sentido de forma desproporcional nas regiões de baixa latitude. Impactos e mudanças observados no • O aumento da aridez e das secas deverá ser consideravelmente sistema climático maior em muitas regiões de países em desenvolvimento localizados nas áreas tropical e subtropical. Os efeitos inequívocos das mudanças no sistema climático causadas pela emissão de gases do efeito estufa, conforme Um mundo em que o aquecimento chegue a 4 °C acima tratadas no Quarto Relatório de Avaliação do IPCC (IPCC AR4) em das temperaturas registrados na era pré-industrial (doravante, 2007, continuaram a se intensificar, praticamente sem freio algum: um mundo 4 °C mais quente) enfrentaria ondas de calor sem • A concentração do principal gás do efeito estufa, o dióxido de precedentes, graves secas e grandes inundações em muitas carbono (CO2), continuou a aumentar, passando de um nível regiões, com sérios impactos sobre os sistemas humanos, os pré-industrial de aproximadamente 278 partes por milhão ecossistemas e os serviços a eles associados. (ppm) para mais de 391 ppm em setembro de 2010, com o Um aquecimento da ordem de 4 °C ainda pode ser evitado: atual índice de aumento na casa de 1,8 ppm ao ano. inúmeros estudos mostram que existem trajetórias viáveis do • Segundo os indícios paleoclimáticos e geológicos, a atual ponto de vista técnico e econômico para as emissões, de modo a, concentração de CO2 é superior a qualquer nível registrado provavelmente, manter o aquecimento abaixo de 2 °C (Figura 1). nos últimos 15 milhões de anos. Assim, o nível dos impactos a serem sentidos pelos países em • As emissões de CO2 somam, no momento, cerca de 35 bilhões desenvolvimento e pelo resto do mundo resultará das decisões e de toneladas ao ano (inclusive a resultante de mudanças no 2 R esum o Executi vo uso da terra) e, na falta de novas políticas, deve subir para e da Antártica, e isso poderia contribuir bastante para a elevação 41 bilhões de toneladas ao ano em 2020. do nível dos mares no futuro. No geral, o índice de perda de • A mediana da temperatura global continua a subir e agora é gelo mais do que triplicou desde o período 1993–2003, conforme cerca de 0,8 °C superior aos níveis pré-industriais. informado no IPCC AR4, chegando a 1,3 cm por década entre 2004 e 2008; em 2009, esse índice equivalia a cerca de 1,7 cm por Um aquecimento global de 0,8 °C talvez não pareça muito, década. Se a perda da camada de gelo prosseguisse nesse ritmo, mas vários impactos da mudança climática já começaram a surgir, sem aceleração, o aumento do nível médio dos mares no mundo e um aumento do aquecimento de 0,8 °C para 2 °C ou mais criará em virtude desse fator seria de cerca de 15 cm até o fim do século desafios ainda maiores. Também é útil ter em mente que um XXI. O rápido crescimento da área derretida observada desde a aumento da mediana da temperatura global de 4 °C se aproxima década de 1970 ilustra claramente o aumento da vulnerabilidade da diferença entre as temperaturas atuais e as registradas na da camada de gelo da Groenlândia ao aquecimento. Já o gelo do última era glacial, quando boa parte da Europa Central e da região Oceano �rtico chegou ao seu nível mínimo em setembro de 2012, norte dos Estados Unidos estavam cobertos por quilômetros de com a redução pela metade da área coberta por gelo naquele gelo e a mediana das temperaturas globais era de 4,5 °C a 7 °C oceano durante o verão ao longo dos últimos 30 anos. mais baixa. Ademais, a mudança climática dessa magnitude — Os efeitos do aquecimento global também estão provocando causada pelo homem — não vem ocorrendo ao longo de milênios, mudanças já notadas em muitos outros aspectos climáticos e mas de um século. ambientais no sistema da Terra. Na última década, testemunhou- Os oceanos continuaram a se aquecer, com cerca de 90% se um número excepcional de ondas de calor extremo em todo do excedente de energia térmica preso pelo aumento das o mundo, que causaram graves impactos. Desde a década de concentrações de gases do efeito estufa desde 1955 acumulado 1960, a mudança climática causada pelo homem vem elevando nos oceanos na forma de calor. A elevação média do nível dos a frequência e a intensidade das ondas de calor e, por extensão, mares em todo o mundo ao longo do século XX foi de cerca de 15 provavelmente vem agravando os impactos sobre a sociedade. Em a 20 centímetros. Na última década, a taxa média de elevação do algumas regiões climáticas, as precipitações e as secas extremas nível dos mares subiu para aproximadamente 3,2 cm por década. aumentaram em intensidade e/ou frequência e, é bem provável Caso essa taxa se mantenha constante, isso se traduziria em uma que haja uma influência humana. A onda de calor na Rússia em elevação extra do nível do mar de mais de 30 cm no século XXI. 2010, que teve consequências adversas bastante significativas, é O aquecimento da atmosfera e dos oceanos está provocando a um exemplo de uma recente onda de calor extremo. As estimativas aceleração do derretimento das camadas de gelo da Groenlândia preliminares referentes a essa onda na Rússia indicam 55 mil 3 Dimin ui r o ca lo r: p or qu e u m m u n d o 4 °C ma is qu en te pr ec isa ser evita do Figura 2: Compilação de múltiplos modelos das medianas das temperaturas mensais quentes mais extremas registradas em cada local no período de 2080 a 2100 nos meses de julho (esquerda) e janeiro (direita) em temperaturas absolutas (gráfico superior) e em anomalias comparadas com a temperatura mensal mais extrema simulada durante os dias atuais (gráfico inferior). A intensidade da escala de cor foi reduzida sobre os oceanos para facilitar a distinção. °C °C mortos, uma perda anual de cerca de 25% da lavoura, queimadas de novas reduções no crescimento econômico dos países pobres em mais de 1 milhão de hectares e um prejuízo econômico da no futuro em consequência do aquecimento global. Um estudo ordem de US$ 15 bilhões (1% do PIB). do MIT1 usou flutuações históricas da temperatura nos países Na ausência da mudança climática, as ondas de calor extremo para identificar seus efeitos sobre os resultados econômicos na Europa, na Rússia e nos Estados Unidos, por exemplo, deveriam agregados. Foi relatado que a elevação das temperaturas diminui ocorrer apenas de centenas em centenas de anos. As observações substancialmente o crescimento econômico nos países pobres apontam que a área do planeta que vem experimentando calor e surtem uma ampla gama de efeitos, reduzindo a produção extremo cresceu 10 vezes desde 1950. agrícola e industrial, e afetando a estabilidade política. Essas Já a área da Terra afetada por secas também cresceu constatações embasam as discussões sobre a função do clima consideravelmente nos últimos 50 anos, a um ritmo um pouco no desenvolvimento econômico e sugerem a possibilidade de mais rápido do que o projetado pelos modelos climáticos. A seca temperaturas mais altas gerarem impactos negativos substanciais de 2012 nos Estados Unidos causou um impacto sobre cerca de sobre os países pobres. 80% das terras cultiváveis, tornando-se a mais rigorosa seca desde a década de 1950. Os efeitos negativos da elevação das temperaturas sobre Projeção dos impactos da mudança a produção agrícola já foram observados, e estudos recentes climática em um mundo 4 °C mais quente indicam que, desde a década de 1980, a produção mundial de milho e de trigo pode ter se reduzido significativamente em Os efeitos de um aquecimento de 4 °C não serão distribuídos comparação com um cenário sem a mudança climática. igualmente em todo o mundo, da mesma maneira que as Também já foram observados os efeitos da elevação das temperaturas sobre o crescimento econômico dos países mais 1 Dell, Melissa, Benjamin F. Jones, and Benjamin A. Olken. 2012. “Temperature pobres nas últimas décadas, o que sugere um risco considerável Shocks and Economic Growth: Evidence from the Last Half Century�. American Economic Journal: Macroeconomics, 4(3): 66-95. 4 R esum o Executi vo Figura 3: Estimativas da mediana (linhas) das projeções probabilísticas do pH na superfície dos oceanos. O pH mais baixo indica uma acidificação mais grave do oceano, o que inibe o crescimento de organismos calcificantes, como moluscos e crustáceos, fitoplânctones calcários e recifes de corais. O cenário SRES A1FI mostra o aumento da acidificação dos oceanos provavelmente associado ao aquecimento superior a 4 °C em relação a temperaturas pré-industriais. A faixa de incerteza de 95% (área sombreada) é apresentada em um cenário apenas para facilitar a leitura do gráfico e se deve principalmente à incerteza do ciclo do carbono. Os cenários e métodos de modelagem podem ser consultados em Bernie et al., 2010; Rogelj et al., 2010; Hare et al., 2011; Schaeffer et al., 2012. Cenário ilustrativo de baixa emissão 8,1 com fortes emissões negativas de CO2 Interrupção abrupta das emissões mundiais em 2016 8 RCP3PD 50% de chance de superar 2 °C pH dos oceanos 7,9 Promessas atuais Referência (próximo ao SRES A1B) 7,8 7,7 IPCC SRES A1FI 1900 1950 2000 2050 2100 Ano consequências não seriam simplesmente uma extensão das calor extremo projetados para um mundo 4 °C mais quente sentidas no caso de um aquecimento de 2 °C. O aquecimento ainda não foram avaliados, mas poderiam superar em muito maior ocorrerá em áreas de terra e variará de 4 °C a 10 °C. as consequências sentidas até o momento e até suplantar a Devem ocorrer aumentos de 6 °C ou mais na média mensal das capacidade de adaptação de muitas sociedades e sistemas temperaturas no verão, em grandes regiões do mundo, como o naturais. Mediterrâneo, a �frica Setentrional, o Oriente Médio e a porção continental dos Estados Unidos (Figura 2). As projeções de um mundo 4 °C mais quente mostram um A elevação da concentração de CO2 e a aumento drástico da intensidade e frequência de temperaturas acidificação dos oceanos extremamente elevadas. As recentes ondas de calor extremo, como a ocorrida na Rússia em 2010, provavelmente se transformarão Além do aquecimento do sistema climático, uma das mais graves em um verão normal nesse mundo 4 °C mais quente. A porção consequências do aumento da concentração de dióxido de carbono tropical da América do Sul, a �frica Central e todas as ilhas na atmosfera ocorre quando esse gás se dissolve nos oceanos e tropicais do Pacífico provavelmente passarão a experimentar provoca a acidificação. Uma elevação substancial da acidez dos ondas de calor de magnitude e duração sem precedentes. Nesse oceanos vem sendo observada desde o período pré-industrial. novo regime climático de temperaturas altas, é provável que os Um aquecimento de 4 °C ou mais até 2100 corresponderia a meses mais frios sejam bem mais quentes do que os meses mais uma concentração de CO2 superior a 800 ppm e uma elevação de quentes no fim de século XX. Nas regiões como o Mediterrâneo, cerca de 150% na acidez dos oceanos. Ao que parece, as taxas de a �frica Setentrional, o Oriente Médio e o planalto do Tibete, variação da acidez dos oceanos observadas e projetadas ao longo quase todos os meses de verão deverão ser mais quentes do que do próximo século não encontram paralelo na história da Terra. as ondas de calor mais extremo sentidas atualmente. Por exemplo, Já surgem indícios das consequências adversas da acidificação o mês de julho mais quente na região do Mediterrâneo poderia para os organismos e ecossistemas marinhos, combinadas com os ser 9 °C mais quente do que o mês de julho mais quente dos efeitos do aquecimento, da pesca descontrolada e da destruição dias de hoje. do habitat (Figura 3). As ondas de calor extremo dos últimos anos tiveram graves Os recifes de corais, em especial, são extremamente impactos, provocando mortes em função do calor, incêndios sensíveis a variações na temperatura da água, ao pH do oceano nas matas e a perda de colheitas. Os impactos das ondas de e à intensidade e frequência dos ciclones tropicais. Os recifes 5 Dimin ui r o ca lo r: p or qu e u m m u n d o 4 °C ma is qu en te pr ec isa ser evita do oferecem proteção contra inundações na região costeira e contra nos próximos séculos. Se o aquecimento for limitado a 2 °C, o aumento das tempestades e os danos causados pelas ondas, seria possível reduzir a elevação do nível dos mares em cerca além de servirem de berçário e habitat para muitas espécies de de 20 cm até 2100, em comparação com um mundo 4 °C mais peixes. O crescimento dos recifes de corais pode ser interrompido quente. Contudo, mesmo que o aquecimento global seja limitado à medida que a concentração de CO2 se aproxime de 450 ppm nas a 2 °C, a mediana global do nível dos mares poderia continuar a próximas décadas (o que corresponde a um aquecimento de cerca se elevar, com algumas estimativas variando entre 1,5 e 4 metros de 1,4 °C na década de 2030). Quando a concentração chegar a acima dos níveis atuais até o ano 2300. A elevação do nível dos aproximadamente 550 ppm (o equivalente a um aquecimento de mares provavelmente se limitaria a menos de 2 metros apenas quase 2,4 °C na década de 2060) é provável que os recifes em se o aquecimento fosse contido e ficasse bem abaixo de 1,5 °C. muitas áreas comecem a se dissolver. A combinação de episódios A elevação do nível dos mares vai variar de região para região: de branqueamento causado pelo calor, de acidificação do oceano por várias razões de natureza geofísica, ela será até 20% mais e de elevação do nível dos mares põe em risco grandes porções de alta nos trópicos e abaixo da média nas latitudes mais altas. recifes de corais mesmo com um aquecimento global de 1,5 °C. Em especial, o derretimento das camadas de gelo reduzirá a A extinção regional de ecossistemas inteiros de recifes, o que atração gravitacional do oceano na direção das calotas polares poderia ocorrer bem antes de o aquecimento chegar a 4 °C, teria e, em consequência, a água dos oceanos tenderá a gravitar na profundas consequências para as espécies dependentes e para direção da linha do equador. As variações nas correntes de vento as pessoas que a eles recorrem para obter alimento ou renda ou e oceânicas em virtude do aquecimento global e de outros fatores, que vivem em áreas onde os recifes são uma atração turística ou assim como os padrões de absorção de calor e aquecimento dos servem de proteção da orla. oceanos, também afetarão a elevação do nível dos mares nas diferentes regiões. Os impactos da elevação do nível dos mares devem ser Elevação do nível dos mares, inundação assimétricos mesmo nas regiões e países. Entre os impactos de áreas costeiras e prejuízos projetados para 31 países em desenvolvimento, apenas 10 cidades respondem por dois terços da exposição total a inundações em Um aquecimento de 4 °C provavelmente resultará em uma níveis extremos. As cidades altamente vulneráveis estão em elevação do nível dos mares de 0,5 a 1 metro, ou possivelmente Moçambique, Madagáscar, México, Venezuela, �ndia, Bangladesh, de até mais, até 2100, com o acréscimo de mais e mais metros Indonésia, Filipinas e Vietnã. 6 R esum o Executi vo No caso dos pequenos Estados insulares e de regiões de Como os extremos em termos de precipitação e secas devem deltas de rios, a elevação do nível dos mares deve produzir aumentar com o aquecimento, esses riscos devem ser bem uma ampla gama de consequências adversas, sobretudo quando maiores em um mundo 4 °C mais quente do que em outro 2 °C combinadas com a projeção do aumento da intensidade de mais quente. Neste mundo 2 °C mais quente: ciclones tropicais em muitas regiões dos trópicos, com outros eventos climáticos extremos e com os efeitos provocados pela • As bacias hidrográficas em que predomina o regime de mudança climática sobre os ecossistemas oceânicos (por monções, como a do Ganges e a do Nilo, são especialmente exemplo, a perda da proteção dos recifes em consequência do vulneráveis a variações na sazonalidade do escoamento, o aumento da temperatura e da acidificação dos oceanos). que pode resultar em grandes impactos adversos sobre a disponibilidade de água. • A mediana do escoamento anual deve cair de 20% a 40% Riscos para os sistemas de apoio nas bacias do Danúbio, do Mississipi, do Amazonas e do aos seres humanos: alimentos, água, Murray e Darling, mas deve subir quase 20% nas bacias do ecossistemas e saúde Nilo e do Ganges. Embora a projeção dos impactos de um mundo 4 °C mais A magnitude de todas essas mudanças praticamente dobra quente ainda seja preliminar e, muitas vezes, seja difícil fazer em um mundo 4 °C mais quente. comparações entre avaliações, este relatório identifica uma O risco de prejuízos para os ecossistemas em função de série de riscos extremamente graves para os sistemas de apoio mudanças e transformações nesses ecossistemas, de incêndios vitais para os seres humanos. Como os extremos em termos de em matas e do declínio das florestas seria bem maior com um temperatura, ondas de calor, chuvas e secas devem se elevar aquecimento de 4 °C, em comparação com aquecimentos mais por causa do aquecimento, os riscos serão bem maiores em um brandos. O aumento da vulnerabilidade ao calor e à pressão mundo 4 °C mais quente do que em outro 2 °C mais quente. causada pela seca deverá provocar um aumento da mortalidade Em um mundo que vem esquentando rapidamente rumo a e a extinção de espécies. uma temperatura 4 °C mais alta, a maior parte dos impactos Os ecossistemas serão afetados por eventos climáticos adversos sobre a disponibilidade de água deve ocorrer em extremos mais frequentes, como a perda de vegetação em combinação com a expansão da demanda por água à medida consequência de secas e de incêndios agravados pelo uso da que a população cresce. Algumas estimativas indicam que terra e pela expansão agrícola. Na Amazônia, os incêndios um aquecimento de 4 °C agravaria consideravelmente a atual florestais poderiam dobrar até 2050 com um aquecimento de escassez de água em muitas regiões, sobretudo no norte e aproximadamente 1,5 °C a 2 °C acima dos níveis pré-industriais. no leste da �frica, no Oriente Médio e na �sia Meridional, As mudanças poderiam ser ainda mais graves em um mundo enquanto outros países na �frica passariam a enfrentar a falta 4 °C mais quente. de água em uma escala nacional em virtude do crescimento De fato, a mudança climática em um mundo 4 °C mais quente da população. provavelmente se tornará o fator dominante a impulsionar as mudanças nos ecossistemas, ultrapassando a destruição do • As projeções são de condições mais áridas na Europa habitat como a maior ameaça à biodiversidade. Estudos recentes Meridional, na �frica (salvo em algumas áreas ao nordeste), sugerem que uma perda da biodiversidade em grande escala em grandes porções da América do Norte e do Sul, e no sul deve ocorrer em um mundo 4 °C mais quente, com a mudança da Austrália, entre outras regiões. climática e as elevadas concentrações de CO2 acarretando uma • Já as projeções de condições mais úmidas abrangem, em transição dos ecossistemas da Terra para uma situação que a especial, as latitudes mais altas no hemisfério norte — ou experiência humana ainda desconhece. A expectativa é que seja, o norte da América do Norte, a Europa Setentrional e a os danos aos ecossistemas reduzam drasticamente a oferta de Sibéria — e algumas regiões de monções. Algumas regiões serviços dos ecossistemas de que a sociedade depende (por talvez enfrentem uma pressão menor em virtude da oferta exemplo, a pesca e a proteção da orla proporcionadas pelos de água, em comparação com um cenário sem mudança recifes de corais e manguezais). climática. A manutenção da produção agropecuária e de alimentos em • As mudanças subestacionais e sub-regionais no ciclo face ao crescimento da população e ao aumento dos níveis de hidrológico estão associadas a riscos graves, como renda será um desafio a despeito da mudança climática causada os de inundações e secas, os quais podem aumentar pelo homem. Segundo projeções do IPCC AR4, a produção consideravelmente mesmo que as médias anuais pouco mundial de alimentos cresceria se as temperaturas médias locais variem. 7 Dimin ui r o ca lo r: p or qu e u m m u n d o 4 °C ma is qu en te pr ec isa ser evita do aumentassem entre 1 °C a 3 °C, mas se reduziria no caso de consideráveis sobre os níveis de pobreza e saúde humana são aumentos maiores. esperados. As variações de temperatura, índices de precipitação Novos resultados publicados a partir 2007, porém, são bem e umidade influenciam as doenças transmitidas por vetores (por menos otimistas. Eles sugerem, na verdade, um risco cada vez exemplo, a malária e a dengue), bem como as hantaviroses, a maior de redução da produtividade agrícola à medida que o leishmaniose, a doença de Lyme e a esquistossomose. mundo se aqueça. Já foram observados grandes efeitos negativos Entre os demais impactos sobre a saúde causados pela em temperaturas altas e extremas em várias regiões, como a mudança climáticas estão as lesões e mortes provocadas por �ndia, a �frica, os Estados Unidos e a Austrália. Por exemplo, eventos climáticos extremos. Níveis de neblina e fumaça ainda efeitos significativos não lineares foram observados nos Estados mais altos por causa do calor poderiam agravar problemas Unidos com a elevação das temperaturas diárias para 29 °C no respiratórios e doenças do coração e dos vasos sanguíneos, caso do milho e 30 °C no caso da soja. Esses novos resultados enquanto, em algumas regiões, aumentos na concentração de e observações indicam um risco considerável de os limites alérgenos no ar (pólen, esporos) provocados pela mudança referentes às altas temperaturas serem superados, o que poderia climática poderiam elevar os índices de alergias respiratórias. prejudicar enormemente a segurança alimentar mundial em um mundo 4 °C mais quente. Esses riscos são agravados pelo efeito adverso da elevação Riscos de problemas e deslocamentos do nível dos mares sobre a agricultura em áreas baixas de delta, em um mundo 4 °C mais quente como em Bangladesh, no Egito, no Vietnã e em partes da costa africana. Essa elevação provavelmente impactaria muitas áreas A mudança climática não vai ocorrer no vácuo. O crescimento costeiras em latitudes médias e aumentaria a penetração da econômico e populacional no século XXI deverá contribuir para água do mar em aquíferos costeiros usados para a irrigação de o bem-estar do homem e o aumento da capacidade de adaptação planícies costeiras. Outros riscos decorrem da possibilidade de um em muitas regiões — ou até mesmo na maioria delas. Ao mesmo aumento das secas em regiões de média latitude e do aumento tempo, porém, haverá pressões e demandas cada vez maiores das inundações em latitudes mais altas. sobre um ecossistema planetário que já está se aproximando de O aumento projetado da intensidade de eventos extremos limites e fronteiras críticos. A resiliência de muitos ecossistemas no futuro provavelmente teria implicações adversas para naturais e controlados deve ser solapada por essas pressões e os esforços de redução da pobreza, sobretudo nos países em pelas consequências previstas da mudança climática. desenvolvimento. As projeções recentes indicam que os pobres Os impactos previstos sobre a disponibilidade de água, são bastante sensíveis ao aumento da intensidade das secas em os ecossistemas, a agropecuária e a saúde humana poderiam um mundo 4 °C mais quente, especialmente na �frica, na �sia levar a um deslocamento em grande escala de populações e ter Meridional e em outras regiões. consequências adversas para a segurança humana e para os Eventos extremos em grande escala, como grandes inundações sistemas econômicos e comerciais. A extensão total dos danos que prejudicam a produção de alimentos, também poderiam em um mundo 4 °C mais quente não foi avaliada até o momento. acarretar déficits nutricionais e o aumento da incidência de Mudanças prejudiciais e de grande escala no sistema da epidemias. Inundações podem lançar contaminantes e doenças Terra geralmente não são incluídas nos exercícios de modelagem nas redes de abastecimento de água potável e aumentar a e, menos ainda, nas avaliações dos impactos. À medida que o incidência de diarreia e doenças respiratórias. Os efeitos da aquecimento global se aproxima e supera a casa dos 2 °C, cresce mudança climática na produção agropecuária podem agravar o risco de ultrapassarmos os limites não lineares de elementos a subnutrição e a desnutrição em muitas regiões — fatores que cruciais para esse sistema, com impactos abruptos da mudança já contribuem bastante para a mortalidade infantil nos países climática e regimes climáticos com temperaturas em níveis sem em desenvolvimento. Embora a expansão da economia deva precedentes. Como exemplos, destacam-se a desintegração da reduzir consideravelmente o atraso no crescimento infantil, a camada de gelo da Antártica Ocidental, provocando uma elevação mudança climática deve reverter esses ganhos em várias regiões: do nível dos mares mais rápida do que o projetado nesta análise, aumentos substanciais dos índices de atraso no crescimento ou o declínio em larga escala da Amazônia, afetando drasticamente em consequência da desnutrição devem ocorrer no caso de um os ecossistemas, os rios, a agropecuária, a produção de energia aquecimento entre 2 °C e 2,5 °C, sobretudo na �frica Subsaariana e os meios de subsistência. Esses processos poderiam contribuir e na �sia Meridional, quadro esse que provavelmente seria ainda consideravelmente para o aquecimento global no século XXI e pior no caso de um aquecimento de 4 °C. Apesar dos esforços resultar em impactos em uma escala quase continental. envidados para melhorar os serviços de saúde (por exemplo, Em certos setores econômicos, também poderia haver a melhoria do atendimento médico, o desenvolvimento da reações não lineares a níveis elevados de aquecimento global. vacinação e os programa de vigilância sanitária) novos impactos Por exemplo, os efeitos não lineares da temperatura sobre a 8 R esum o Executi vo agricultura deverão ser extremamente importantes à medida que eles passam a ocorrer cada vez mais, agravando o impacto global. o mundo se aproxime de um aquecimento de 2 °C e ultrapasse Por exemplo, um grande choque na produção agrícola em função esse nível. Contudo, a maioria dos nossos modelos atuais sobre de temperaturas extremas em muitas regiões, juntamente com produtos agrícolas ainda não leva em conta plenamente esse uma pressão substancial sobre os recursos hídricos e mudanças efeito nem os possíveis aumentos das faixas de variabilidade no ciclo hidrológico, provavelmente teria um impacto sobre a (por exemplo, temperaturas extremas, novas doenças e pragas saúde humana e sobre os meios de subsistência. Por sua vez, invasoras, e mudanças bruscas em fatores climáticos cruciais isso poderia ter efeitos em cascata sobre o desenvolvimento que produzam grandes impactos sobre a produtividade e/ou a econômico, ao reduzir a capacidade de trabalho da população, o qualidade dos grãos). que então prejudicaria o crescimento do PIB. As projeções do custo dos danos causados pelos impactos da Com o aumento das pressões à medida que o aquecimento mudança climática normalmente avaliam os custos dos danos avança para os 4 °C, agravado pelas tensões sociais, econômicas locais, como à infraestrutura, mas não consideram suficientemente e populacionais não relacionadas ao clima, crescerá o risco de os efeitos em cascata (por exemplo, as cadeias de valor agregado ultrapassar limites cruciais dos sistemas sociais. Nesse ponto, e as redes de abastecimento) em âmbito nacional e regional. as instituições que teriam apoiado medidas visando a adaptação Contudo, em um mundo cada vez mais globalizado que passa provavelmente perderiam boa parte da sua eficácia ou até mesmo por uma crescente especialização dos sistemas de produção e, entrariam em colapso. Um exemplo é o risco de que a elevação dessa forma, mais dependente da infraestrutura para distribuir os do nível dos mares em países em atóis exceda a capacidade de bens produzidos, os danos aos sistemas de infraestrutura podem migração controlada e adaptativa, o que resultaria na necessidade acarretar impactos indiretos substanciais. Os portos marítimos são de abandonar completamente uma ilha ou região. De maneira um exemplo de um ponto de partida em que um colapso ou uma análoga, as pressões sobre a saúde humana, como as causadas interrupção considerável nas instalações de infraestrutura poderia por ondas de calor, desnutrição e deterioração da qualidade da desencadear impactos que vão bem além do local específico do água potável em virtude da mistura com a água do mar, poderiam prejuízo. sobrecarregar os sistemas de saúde de tal maneira que a adaptação Os efeitos cumulativos e interativos de impactos tão amplos, muitos dos quais deverão ser sentidos bem antes do aquecimento se tornaria impossível, obrigando as pessoas a se deslocarem. de 4 °C, não são bem compreendidos. Por exemplo, não há na Portanto, considerando que toda a natureza e escala dos literatura científica um estudo sequer publicado sobre todas as impactos ainda está cercada de incerteza, ainda não se sabe ao consequências para a ecologia, os seres humanos e a economia certo se a adaptação a um mundo 4 °C mais quente é possível. de um colapso dos ecossistemas de recifes de corais — e muito Em um mundo 4 °C mais quente, as comunidades, cidades e menos quando combinado com a provável perda simultânea da países provavelmente enfrentariam graves problemas, danos produção marinha devido à elevação da temperatura dos oceanos e deslocamentos, e muitos desses riscos seriam distribuídos e ao aumento da acidificação e com os enormes impactos sobre de forma desigual. É provável que os pobres sofram mais, e os assentamentos humanos e sobre a infraestrutura em zonas a comunidade mundial poderia se tornar ainda mais dividida costeiras baixas resultantes da elevação do nível dos mares em e desigual do que é hoje. De forma bem simples, não se pode um metro ou mais neste e nos próximos séculos. permitir que a previsão de aquecimento de 4 °C se concretize — À medida que a escala e o número de impactos aumenta com é preciso diminuir o calor. Para que isso aconteça, é preciso agir a elevação da mediana da temperatura global, as interações entre em tempo hábil e cooperar no plano internacional. 9 10 Lista de Siglas e Abreviaturas °C graus Celsius AR4 Quarto Relatório de Avaliação do Grupo Intergovernamental de Peritos sobre Mudança Climática cm centímetro CO2 dióxido de carbono IPCC Grupo Intergovernamental de Peritos sobre Mudança Climática PIB produto interno bruto ppm partes por milhão SRES Relatório Especial sobre Cenários de Emissão do IPCC UNFCCC Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima 11